22 fevereiro 2006

No Satisfaction

O primeiro surpreende. Você pergunta: “será?”. Daí vem o segundo, e você, menos assustado, resigna-se com a companhia temporária. O terceiro e o quarto são normais, aguardados. Se você prestar atenção demais, acaba se irritando. Não adianta querer calcular o espaço entre eles. Às vezes, ficam presos na garganta durante intermináveis segundos.

Soluçar é uma das atividades mais frustrantes da vida de um homem. Não sei nem se chamaria de atividade, já que é mais como um ataque, uma experiência de pane corporal, de doença incurável. É a realização do medo, pois não temos absolutamente nenhum controle sobre aquilo, não sabemos quando vai parar ou porque começou.

Enquanto dura o soluço, não somos donos de nós mesmos. Perdemos o controle. Apesar de todas as mandingas e crenças populares, quicamos a esmo, satisfazendo os desejos de uma força oculta. Somos bonecos do destino, se você acredita nele. Logicamente, o soluço vem em intervalos irregulares, não haveria de ser previsível, o danado.

Não conheço explicações científicas sobre isso. Mas também, como estudar algo que não sabemos quando vai acontecer? Pode ser em casa, vendo TV, ou no trabalho, digitando aquele relatório urgente. Pode ser no boteco, com seus amigos, ou no almoço de domingo em que você está conhecendo sua sogra. Pode ser no trânsito, ou até no confessionário da sua igreja. Por que não?

As coisas ruins coisas da vida vêm mesmo sem aviso. Uma traição. Um acidente de carro. Sua namorada terminar com você (mas tinha que soluçar logo com a comida da mãe dela?). São situações que te dominam e depois de abandonam. Igualzinho os soluços.

Como pra soluço não há solução, proponho uma saída: da próxima vez que receber esta visita inevitável, não se sinta mal. Pare tudo que está fazendo e fique a pensar na vida. Qualquer coisa. Relaxe, respire, abstraia. Faça uma pausa no seu dia. Aproveite estes momentos em que seu corpo, de certa forma, vem te visitar.

***

Fiz esta crônica para aula de Oficina Avançada de Narrativas.

2 comentários:

Asgardiano disse...

eu gosto de soluçar.
ainda fico com a boca aberta pra ele sair alto :D

Gabriel disse...

Heheuahuehaueha
Você é o primeiro que eu conheço que gosta, JB.